sexta-feira, 25 de abril de 2014

R de Regresso ao real (IX)


Eu tentava recordar
esse belo
poema
nunca escrito

formado no seio da noite
e quase maduro
mergulhara
fundido na luz do dia
já não existia

esse poema era verdadeiramente
um poema sobre si próprio
tal como uma pérola
é a descrição de uma pérola
e uma borboleta a descrição de uma borboleta

por instantes tinha-o na ponta da língua
e inquieto esperava
a sua transmutação
em verbo

esse poema evanescente
à luz do dia
fechou-se sobre si próprio
e só às vezes
volta a brilhar com intensidade

mas nunca tento retirá-lo
das suas profundezas obscuras
para o depor sobre a margem lisa
da realidade


Tadeusz Rózewicz
in Inquiétude, Paris: Buchet/Chastel, 2005

[Trad. ID]

1 comentário:

Odracir disse...

Uma pérola!
Merci, ID