segunda-feira, 25 de agosto de 2025

P de "Photographing Fairies" (II)

 


[ID, Caneiras, 17/08/013]



[ID, Raposa, 23/08/025]

sábado, 16 de agosto de 2025

P de Poética (LXIII)

 

And if you missed a day, there was always the next

- LOUISE GLÜCK -


*


Tous les matins du monde sont sans retour.

- PASCAL QUIGNARD


4



Quando conheci a Morte
o verão era um tigre
a respirar junto do meu pescoço.
E a Morte estava embriagada de abelhas;
a Morte era metálica.


À espera entre folhas verdes
a Morte usava o vermelho da raposa;
as abelhas como pepitas de ouro
fervilhavam no coração da Morte.
O sangue da Morte era negro.


Sobressaltada, regressei
a um súbito isolamento.
Agora já sei a cor da estação da Morte:
ouro, vermelho e verde.
A língua da Morte é negra.


- Rikki Ducornet
[Trad. ID]

sexta-feira, 8 de agosto de 2025

P de "Primavera, Verão, Outono, Inverno e... Primavera" (V)


24.

e se o demónio voltar - enquanto persegues a aranha pelas paredes da noite e do dia - e disser que a possibilidade de regresso não é uma teoria física nem moral apenas estética? enfrentarás com a mesma impaciência os meses que se erguem com espuma, se suspendem e aceleram em ondas pesadas e regulares como a respiração de um gigante? escrevo esta carta no início do verão, uma mão litoral no cabelo enquanto hesito. o automóvel está estacionado à porta de casa, o resto a caminho do sul. no final hão-de restar apenas as estrias de sal sobre o dorso, a interpretação desses mapas.


Tiago Araújo, Livre Arbítrio,
Lisboa, Averno, 2009




[ID | Santarém, 04/2013]

quarta-feira, 6 de agosto de 2025

L de (A) Luz da Sombra (L)

 

"Quando o médico lhe tirou as ligaduras e a levou ao jardim, a menina que já não era cega viu 'a árvore que tem luzes'. Foi essa árvore que procurei entre os pomares de pessegueiros do Verão, nos bosques do Outono e ao longo de todo o Inverno e toda a Primavera, durante anos. Até que um dia estava a passear ao lado do rio Tinker, não pensando em coisa nenhuma, e vi a árvore que tem luzes. Vi o cedro das traseiras, em que as rolas-carpideiras se empoleiravam durante a noite, tenso e transfigurado, cada uma das suas células zumbindo com ardor. [...] Não era tanto ver, mas ser vista pela primeira vez, deixada sem fôlego por um olhar poderoso. A torrente de fogo esmoreceu, mas continuo a usar a sua energia. Aos poucos, as luzes apagaram-se no cedro, as cores morreram, as células extinguiram-se e desapareceram. Eu continuava a ressoar. Fui um sino toda a minha vida, mas nunca o soube até esse momento em que me vi erguida e tocada." 

- Annie Dillard, Peregrinação em Tinker Creek, trad. Inês Dias
(Antígona, 2025)





[ID | 'Pelos caminhos da manhã', 025]


terça-feira, 5 de agosto de 2025

A de Anomalia Poética (VIII)

 




[ID, Santarém-Lisboa, 2014-2021]

C de Começar o dia com um livro novo (XIV)

O MUNDO NÃO PODE DORMIR
 
 
 
      Há hoje no mundo pouca gente que durma; as noites são mais longas, mais longos os dias.
     Em todos países, por essa Europa fora, em todas as cidades, em cada rua, cada casa, cada aposento, tornou-se mais curta e febril a tranquila respiração do sono; a época é de fogo, e como se fôra uma única noite de verão, pesada e abafadiça, cai sobre as nossas noites e perturba-nos os sentidos. Quantos, aqui e algures, habituados a deslizar entre o princípio da noite até de manhã na barca negra do sono - enfeitada com as rútilas e flutuantes bandeiras dos sonhos - ouvem agora à noite o tique-taque dos relógios, e vagueiam pelo tremendo caminho que vai desde o cair da sombra até ao aparecimento da luz, e sentem lá dentro o verme dos cuidados a roê-los sem cessar, a roê-los sem descanso, até que o coração adoece e fica em ferida. Toda a humanidade tem agora febre de dia e de noite; esse terrível, pavoroso estar desperto transparece nos sentidos sobreexcitados de milhões de criaturas: o destino penetra, invisível, através de milhares de portas e janelas e expulsa o sono; de cada leito afugenta o esquecimento. Há pouco quem durma no mundo; são mais longas as noites, mais longos os dias. Ninguém pode estar sozinho consigo e o seu destino; cada um de nós espreita para a distância. [...]
 
 
Stefan Zweig, O Mundo não pode dormir e outros contos escolhidos,
Porto: Livraria Civilização, 1940