domingo, 28 de setembro de 2014

C de "Conchas, pedrinhas, pedacinhos de ossos..."


PAUSA


Parecia-me que este dia
sem ti
devia ser inquieto,
escuro. Em vez disso está repleto
de uma estranha doçura, que aumenta
com o passar das horas –
quase como a terra
após um aguaceiro,
que fica sozinha no silêncio a beber
a água caída
e pouco a pouco
nas veias mais profundas se sente
penetrada.

A alegria que ontem foi angústia,
tempestade –
regressa agora em rápidas
golfadas ao coração,
como um mar amansado:
à luz suave do sol reaparecido brilham,
inocentes dádivas,
as conchas que a onda
deixou sobre a praia.


Antonia Pozzi
in Morte de uma estação, sel. e trad. de Inês Dias,
Lisboa: Averno, 2012




[Ontem,  uma pausa em Santa Cruz, na melhor das companhias]

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