quarta-feira, 1 de outubro de 2014

R de Rezar na era da técnica (XVIII)


O MAU POEMA


A lição é simples
e basta ouvir uns quantos mestres,
para já não a esquecer no futuro. 
Tu própria a conheces:
a verdadeira arte faz-nos amar a vida;
e embora ensine a dor, e nos possa ferir,
e não consiga tornar-nos mais felizes quando precisamos,
embora nos obrigue a desejar a morte por vezes
- quem o provou o sabe -, a arte, se for autêntica,
reconcilia-nos com a nossa impotência,
infunde-nos uma coragem absurda
para enfrentar o correr dos dias.
De modo que, por tudo isso
e mais algum tópico que tenha esquecido, 
há algo na arte de inevitável que conduz ao amor. 

Mas permite-me agora que esqueça a doutrina.
Retiro tudo aquilo que disse. 
E se o acaso fez com que algum destes versos
te levasse a um sentimento nobre, 
não fui eu quem o instilou neles.
Pensei em desejar-te toda a solidão, toda a cólera,
oferecer-te a ira e o delírio
sem qualquer emenda, sem redenção possível.
Quis que sofresses com o tempo
e que ninguém o soubesse.
Mas já não acho que seja suficiente.
E espero que por isso compreendas agora
na medida certa este meu envio:
se ainda consegues acreditar num poema,
considera-te morta. 


CARLOS MARZAL
[Trad. Inês Dias]


*




[...]

Did you write the book of love
And do you have faith in God above
If the Bible tells you so?
Now do you believe in rock and roll
Can music save your mortal soul
And can you teach me how to dance real slow?

[...]

Sem comentários: