ADAMASTOR
[Miradouro de Santa Catarina, 1927]
Regressámos à praia,
esgotada essa série de acidentes
em que o menor foi o amor,
ao contrário do que se previa.
Deixámos a maré subir
na memória, cancelar-nos
a areia sob os pés, levar
até os restos do navio encalhado
corpo de ossos já limpos.
Podia ter sido o meu.
Somos, afinal, dos últimos:
desfiamos gerações, contando onda após onda
após onda, até ao mergulho final.
E escrevemos como vivemos,
na espuma ou nos vidros embaciados
da cidade, com a teimosa convicção de que
nada ficará – nós não ficaremos.
Inês Dias, Da Capo,
Lisboa, Averno, 2014
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