ACUSAÇÃO AO PRINCÍPIO DA TARDE
Viajo atrás do guarda-freio um saco de livros na mão
o eléctrico quase cheio e na paragem da Sé lá saem
ao que diz o condutor e com ciência pura os carteiristas
muito nervoso aquele que saiu pela porta da frente
E ao dobrar a esquina da Catedral subindo à luz
da Graça insinua então o advogado dos passageiros
atirando na minha direcção a nuca e o polegar dirigido também
mas à frente do peito resguardado
e contando por certo que eu não o visse que andaria eu à cata
pois então das carteiras vizinhas
Meio mundo ficou de rosto para mim
e eu como se todo o mundo
tivesse cristalizado no clarão da coisa insinuada
Nisto de carteiristas
o saber de experiência feito dos guarda-freios faz lei
E posso reafirmá-lo porque chegando à Graça
e em pedindo explicações a criatura lá foi dizendo que
se eu reagia por alguma coisa seria Fiquei
a compreender melhor
o murro de Billy Budd no mestre de armas Claggart
na bela novela
de Herman Melville De um eléctrico na Graça
ao navio Indomável ainda vai existindo a porra do inexplicável
- Abel Neves
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