In a manner of speaking
Um dos meus momentos preferidos do Hamlet, além de outro em que aquela espécie de António Carlos Cortez da peça – quer dizer, a Ofélia – morre afogada, é uma enumeração, talvez a melhor de toda a história da literatura: “words, words, words.”. Em vez de cair na tentação que seria repetir, por si, este recurso de estilo, Zbigniew Herbert consegue dar à mesma ideia uma expressão nova, a qual perde por destruir a simplicidade mas, ao mesmo tempo, ganha em imagética: “we live on archipelagos/ and that water these words what can they do what can they do prince”.
Talvez por acidente, talvez não, o feito que o poeta polaco aqui consegue é sintomático do problema que à partida afecta a nossa possibilidade de nos entendermos. As palavras sofrem da síndrome da peça de mosaico e, mesmo quando ligadas entre si, em todo o poder de uma imagem, não ligam propriamente dois corpos um ao outro, duas compreensões uma à outra, tal como a água, verdadeiramente, nunca liga duas ilhas: “In a manner of speaking/ Semantics won't do/ In this life that we live we only make do/ And the way that we feel/ Might have to be sacrified”.
Hamlet, entre outras coisas, é uma peça sobre a impossibilidade absoluta de extremarmos os sentimentos que temos uns pelos outros. O Eugénio, quando escreveu que “São como um cristal,/ as palavras./ Algumas, um punhal,/ um incêndio”, não podia estar mais longe da verdade. As palavras não são nada, perdem-se entre nós e nós perdemo-nos com elas pelo caminho. Somos ilhas que sobrevivem entre os sussurros de outras, numa solidão em que só podemos ser amigos, em que só podemos ser inimigos de nós próprios. Isto é que é morrer.
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