“não, afasta qualquer dúvida, a verdade não pode ser gravada
em fita magnética como fez o teu pai não pronuncies o seu nome com o canto dos
pássaros mortos ou feridos de morte a verdade não faz ninho nas palavras
agoniza nas palavras e morre com elas na melhor das hipóteses a verdade não habita
em lado nenhum nem sequer no silêncio que fica por debaixo das palavras cospes
sangue em silêncio e é verdade morre-te um irmão em silêncio e é verdade sentes
uma dor aguda em silêncio e é verdade uma dor aguda no coração e num braço mas
não o digas fecha-te dia após dia cada vez mais no silêncio na sua profunda
trincheira quando ao homem lhe falta o suporte da palavra assemelha-se aos
deuses mas não sabe dizê-lo não pode dizê-lo não deve querer dizê-lo […]”
Camilo José Cela, Oficio de Tinieblas 5,
Barcelona: Plaza & Janés Editores, 1989
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