sexta-feira, 18 de setembro de 2020

E de Espera (XXI)

CONTRA-TEMPO



Ainda mais alguns dias até ao acontecimento. Passa-se do outro lado da rua por causa disso - da espera. Toda a gente (alguns) dizem: "é para hoje" e fazem rapidamente as malas. Enchem-nas de chaves iale e parafusos, fusos horários e rocas peadas. "É para já" dizem. São os que anulam muito bem a coisa de que entre cada dia e cada dia há uma noite inteira para comover-se e pousar. Tomam a pose solar e iludem a chuva e todas as faces da água - provando pois que o espaço pode ser impermeável e a vida dois dias - o que esperaram no susto de antes do antes de ser este dia aplacado que fazem - o dia placa - e este. É a gente do já. Faut les aimer, faut les aimer, dizem as avezinhas de frança nos dias úteis. Mas essas não são o acontecimento, nem sequer seu anúncio.


[...]


Maria Velho da Costa, Desescritas, 1973

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