segunda-feira, 26 de agosto de 2013

N de "Na casa de Julho e Agosto" (III)


II. ORLANDO PANTERA
I am a professional



e dançámos
lentos & digestivos

mas tentemos antes passar
o dia a limpo:

o Peugeot 205 vermelho embalado no auto-
rádio a praia pequena a seguir ao Guincho
deserta

o teu peito mulato
contra as ondas o riso ladrado
da cadela entrando e não entrando
no mar

as rochas o mexilhão a navalha
o regresso aos poucos a tua casa
coentros água doce tachos

o lume
onde cozeste o pão
e que ateaste usando as páginas da lista telefónica
- queimando toda a rede fixa de Carcavelos - 
o pássaro
morto na escrivaninha
o desenho a meio

depois a noite a lua

o alpendre onde já não se ouvia o mar
a cadela fingia o sono no tapete suspirava
no fumo dos cigarros

ao fundo do jardim sobre a relva
deixámos várias caixas de sapatos
adaptadas para a fotografia pinhole
abríamos o obturador e o tempo de
exposição era toda a madrugada


Miguel-Manso
in Telhados de Vidro n.º12,
Lisboa: Averno, Maio de 2009

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