SENHORA
Senhora, há demasiados pássaros
No vosso piano
Que atrai o Outono sobre uma selva
Espessa de nervos palpitantes e libélulas
As árvores em arpejos insuspeitados
Às vezes perdem a orientação do globo
Senhora, suporto isso tudo. Sem clorofórmio,
Descendo ao fundo da madrugada,
O rouxinol, rei de Setembro, informa-me
Que a noite se deixa cair entre a chuva
Burlando a vigilância dos vossos olhares
E que uma voz canta longe da vida
Para suster o espaço despregado
O espaço tão cheio de estrelas que está quase a cair
Senhora, às dez cheira a tabaco de artista
Amais o aroma a corpo de pássaro
Sois um fenómeno ligeiro
Vou-me, solitário, até ao ocaso dos turistas:
É muito mais belo
Vicente Huidobro, Mágica,
trad. de Ricardo Marques,
Lisboa, Língua Morta, 2011
Lisboa, Língua Morta, 2011
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