segunda-feira, 2 de abril de 2012

E de "É assim que se faz a História. Sem palavras a mais." (XX)

Os poetas dignos desse nome recusam-se, como os proletários, a deixar-se explorar. A verdadeira poesia habita todo aquele que não se conforma com esta moral, a qual, para manter a sua ordem e o seu prestígio, só sabe construir bancos, quartéis, cárceres, igrejas e bordéis. A verdadeira poesia habita tudo aquilo que liberta o homem daquele bem terrível que tem a cara da morte. Está na obra de Sade, e de Picasso assim como na de Rimbaud, de Lautréamont ou de Freud. Está na invenção da rádio, na expedição do Celiuskin, na revolução de Astúrias, nas greves de França e da Bélgica.

Pode estar tanto na fria necessidade, a de conhecer ou comer melhor, como no sabor do maravilhoso. Há já mais de cem anos, os poetas desceram dos cimos onde julgavam encontrar-se. Vieram para a rua, insultaram os patrões, já não têm deuses, atrevem-se a beijar na boca a beleza e o amor, aprenderam as canções de revolta da multidão infeliz e, sem desfalecer, procuram ensinar-lhes os seus cantos.

Pouco lhes importam os sarcasmos e o riso. Já estão acostumados; mas agora têm a certeza de que falam por todos. Têm a sua própria consciência pelo seu lado.



Paul Éluard, "A Invenção Poética" (excerto)
in Franco Fortini, O Movimento Surrealista, trad. António Ramos Rosa,
Lisboa: Editorial Presença, 1980

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