domingo, 22 de janeiro de 2012

E de "É assim que se faz a História. Sem palavras a mais." (XI)

[...] Aliás, algo agradava a esse público no tom destas vozes proféticas: a seguir à guerra, ele esperava instintivamente da sua literatura uma explosão, um levantamento em massa - tinha o direito de o esperar - representava-a de antemão brutal, excedida, apocalíptica, conquistadora, um pouco à maneira desse desembarque que tinha esperado durante tão longos meses. Comprava muitos livros - todos os que lhe eram propostos de semana a semana, de olho vidrado e sobrancelha carregada, como se lhe estendessem revólveres prontos a disparar, pelos arautos da nova Promessa. Quem o sabia? talvez fosse aquele, era preciso não perder o messias. [...] Contudo a arca milagrosa não se abria, não se avistavam senão os primeiros clarões precursores. Era preciso esperar; à beira do santo Lugar as revistas multiplicavam os novos acampamentos e faziam bicha - equipavam-se como para proteger a raça inteira dos dentes do dragão. Os meses passsaram, e os anos; veio a fadiga, e o desencanto; o público esfregou os olhos. Tinha diante de si este espectáculo chulo: jockeys de "Grand Prix" cavalgando lesmas.


Julien Gracq
in A Literatura no Estômago,
trad. Ernesto Sampaio, Lisboa: A Barca Solar, s/d

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