[...]
Mas quando o tempo se desliga do tempo
e se transforma em boca,
grandes molares negros
e garganta sem fundo,
queda animal num estômago
animal sempre vazio,
engano com canções selvagens a sua fome.
Face ao céu, equipado para o nada,
canto o canto do tempo.
No dia seguinte, nada me fica
destes gargarejos.
E digo-me: a hora não é de canções,
mas de balbuceios.
Deixa-me contar as minhas palavras,
uma a uma.
Arrancadas à insónia e à cegueira,
à cólera e ao nojo
- são tudo o que possuo,
tudo o que possuímos.
[...]
Octavio Paz
(trad. Mário Cesariny)
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