HOMENAGEM A ALLEN GINSBERG
“Vi os melhores espíritos da minha geração destruídos
pela loucura, morrendo à fome histéricos nus”
uiva Allen Ginsberg, poeta americano de S. Francisco,
com os cabelos em desalinho
Eu vi a mesma coisa por cá, Allen,
e penso que acontece assim em toda a parte
Era um grupo, não pròpriamente um grupo, mas
um grupo que se sentava
sempre de costas, ou de lado, sob a chuva
torrencial que algumas palavras provocavam ao abrir-se
Bebia-se muito bagaço, cafés uma vez por outra,
o sangue podia beber-se à vontade:
bastava cortar as veias às mulheres que se aproximavam
Uns escreviam livros que rasgavam
devia ser numa praia para a maré levar as folhas
e de noite, sem lua, bem no alto do rochedo
Outros publicavam nos jornais, raramente
Havia, claro, o papa, os papas, já os escritores
com oficina montada para as bandas da Sé Velha
E os que não morreram, não enlouqueceram ou não se suicidaram
e os que não traíram
esses vão vivendo como podem
e são agora papas cardeais arcebispos
Alguns forçados a voto de pobreza
arrastando-se pela Europa como o meu amigo
Manuel de Castro
um dos melhores espíritos da minha geração, Allen Ginsberg,
que embora não acredites, ainda resiste,
árabe na linha do seu destino infalível
acendedor de palavras
visionário de técnicas amorosas, combativas, mágicas
Mas como ia dizendo, Allen, era um grupo, não pròpriamente
mas um grupo
cujos elementos talvez se odiassem
ou então era amor, sobretudo raiva
contra a cidade senil
Ninguém trabalhava
e os poucos que trabalhavam eram despedidos no dia seguinte
ameaçavam (murmurava-se) as famílias, as instituições,…
Eles
uma família azul que fumava cigarros baratos
que se embebedava com muitas prostitutas
e da qual, desregradamente, certos membros
praticavam a homossexualidade por esteticismo
Era um grupo, não pròpriamente, mas
um grupo, Allen Ginsberg,
de anjos caídos, trémulos, atrás duma nota de vinte
para jantar
- António Barahona, Impressões Digitais (1968)
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