domingo, 20 de novembro de 2022

O de "Onde se lê gato" (II)

Lisboa, 20/11/10

1 comentário:

Anónimo disse...

São eles - e mais ninguém - os príncipes do sol; e nós, obviamente, os escravos da sombra, os servidores de tamanha majestade. Este, em particular, é terrível como um anjo de Herr Rainer, já tentou degolar poetas, confunde crime e ternura, adora música barroca. Ou, como alguém disse:

WEINEN, KLAGEN, SORGEN, ZAGEN (BWV 12)

para o Barnabé, felino


A carne é triste, mas eu leio pouco,
menos ainda do que o meu gato,
que talvez desculpe um dia
o indemonstrável possessivo
que escrevi sem muita convicção.

Pode-se fazer tanta coisa, à noite.
Ouvir por exemplo Bach
– o pai – , tendo por único
cuidado uma atenção distraída
ao gelo que estala no copo
de vidro indonésio. Sim,
não me parece que eu seja,
para já, «politicamente correcto».

– Ou experimentar o amor,
de novo e sempre o amor,
com frias e esgotadas lágrimas
de lume. E, se o amor não
vem (acontece), posso ir dizê-lo
a ninguém, à porta de bares sombrios,
sem esperar sequer um poema.

Porque nem tudo se escreve,
percebe acordando o gato.
Possa ele também não saber,
neste Inverno, que a carne
é mesmo uma coisa muito triste.


M.