quarta-feira, 24 de junho de 2015

sexta-feira, 19 de junho de 2015

C de "Cabeça, coração"


ROSTOS


Baralho a contragosto
Como cartas os rostos,
E todos me são caros.
Às vezes algum tomba,
Inútil procurá-lo.
Desaparece a carta.
Nada sei a respeito. 
Entretanto era um rosto
Que eu amava, e tão belo. 
Baralho as outras cartas. 
O inquieto do meu quarto,
Ou seja, o coração,
A arder continua,
Não já por essa carta,
Por outra em seu lugar.
É um novo semblante.
E o baralho, completo,
Mas sempre desfalcado.
Eis tudo quanto sei,
E ninguém sabe mais. 


Jules Supervielle traduzido por Carlos Drummond de Andrade
in Poesia Traduzida, São Paulo, Cosac Naify, 2011

quarta-feira, 17 de junho de 2015

V de "Volto ao jardim"


PASSOS TRISTES


Voltando para a cama aos apalpões depois de mijar
Abro as espessas cortinas e sinto um sobressalto
Ao ver as nuvens velozes e a limpidez da luz.

Quatro da manhã: os jardins de sombras agrestes
Sob um céu cavernoso, espicaçado pelo vento. 
Há nisto tudo algo que faz rir, 

A lua a correr por entre as nuvens ralas
Como fumo de canhão acaba por se destacar
(Luz cor de pedra aguça as arestas dos telhados)

Elevada, insensata e solitária -
Pastilha do amor! Medalhão da arte!
Oh, lobos da memória! Imensidões! Não,

Virado lá para cima, sinto um leve arrepio.
Esse olhar tão singularmente duro e claro
Tão amplo, tão fixo e penetrante

Traz à memória a intensidade e a dor
De ser jovem; e recorda que nada disso vai voltar,
Mas existe plenamente, noutro sítio, para outros. 


Philip Larkin, Uma Antologia,
trad. Maria Teresa Guerreiro, Coimbra: Fora do Texto, 1989

terça-feira, 16 de junho de 2015

B de Bartleby


segunda-feira, 15 de junho de 2015

A de "aparece de vez em quando uma inês que gostaria de fotografar coincidências" (III)



[Carlos Botelho, “Retrato de Berta Mendes” - detalhe, 1932]



ATENÇÃO


ATENÇÃO   as aranhas percorrem a cidade 
os vermes infiltram-se   Deus não pára de morrer
Exaustivamente a noite despe-se para o amor 
sujo   baleado   sinistro
Os assassinos rodeiam a mesa de oiro 
pesados de ódio   metálicos   podres
e as múmias falantes completam o seu dia

Estamos cercados de postes 
devorando automóveis   telégrafos
a minha ternura é este avião que passa
este cigarro de treva e limo
Nascemos (ouve-me bem) para alimento da noite 
sem outra voz senão veneno
porque entre os vidros e o horizonte
são doidos e lívidos os sonhos que restam

Chegaram panteras escarlates a moer raiva 
amantes aterrorizados   horas    precipícios
e nem uma pequenina flor ou uma praia
ou um leito para estendermos os cabelos

Só a miséria destas noites    o cansaço deste tempo

E o MAR   entre fumo e chuva 
o AMOR dissolvido sob uma campânula   a VIDA


António Barahona, Pássaro-Lyra (Primeiro Tomo da Suma Poética),
Lisboa: Averno, 2015




[ID, Sintra, Maio 011]

domingo, 14 de junho de 2015

P de (Os) Pássaros em Volta (IV)




[ID, '13 de Junho de 2011' - 2015]



sexta-feira, 12 de junho de 2015

quinta-feira, 11 de junho de 2015

D de Dansa (VI)


"The picture that changed everything? When I fell in love with Sabine and she taught me how to dance. After that moment, I stopped taking pictures to prove anything or to be daring. After that moment, I started taking pictures out of love and curiosity. After that moment, I started dancing. [...]"

domingo, 7 de junho de 2015

R de (O) rio da minha aldeia






[...]

É o chamado rio tejo
pelo amor dentro.
Vejo as pontes escorrendo.
Ouço os sinos da treva.
As cordas esticadas dos peixes que violinam a água.
É nas barcas que se atravessa o mundo.
As barcas batem, gritam.
Minha vida atravessa a cegueira,
chega a qualquer lado.
Barca alta, noite demente, amor ao meio.
Amor absolutamente ao meio.
Eu respiro nas quilhas. É forte
o cheiro do rio tejo.

[...]


in Ofício Cantante, Lisboa: Assírio & Alvim, 2009





[ID, Santarém / Julho 010]

sábado, 6 de junho de 2015

V de Vista para um saguão (IV)




[Fotografia da Inês, com ajuda da Lou, em 05/06/015]

quinta-feira, 4 de junho de 2015

quarta-feira, 3 de junho de 2015

E de Espera (XXII)


KM acaba de morrer.
Ele é pequeno e passa diante da minha janela fazendo fumaça no
frio; a boca é grande e ri sozinha quando ele passa.
Não quero que você chegue, amor.
Eu fico aqui inventando a sua demora com sisudez exímia.
Radio on.
Radio on.
Passa carregando a mala pesada.
Mas não chega.
Agora chega.
É aqui o amor?


Ana Cristina Cesar
in Novas Seletas, org. Armando Freitas Filho,
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2004





[ID, 'É aqui o amor?', 015]

terça-feira, 2 de junho de 2015

D de Dia mundial da criança




[ID, Azenhas do Mar, 015]

segunda-feira, 1 de junho de 2015

P de Perder a cabeça (III)





TRITÃO
[Jardim da Sereia, séc. XVIII]


Quero-te assim.
Com as pernas que nunca tive
para te seguir
e todos os dedos que fui
amputando, do lado do coração,
em castigo por não te saber tocar. 

Assim, de cabeça finalmente perdida
para te explicar apenas
o essencial - 

não há palavras 
suficientes a este amor. 
E um poema, mesmo de pedra, 
também passa, a menos que 
te ganhe para sempre os olhos. 


Inês Dias, Da Capo,
Lisboa: Averno, 2014





[Tritões: Sintra, 30/05/15 e Coimbra, 18/12/11]