COMO AMAR OS MORTOS
Ela vive, diz o pássaro, e não diz nenhum
disparate. Ela está morta e disponível,
diz a raposa, conhecendo os espíritos.
Não a fotografia no funeral,
não o objecto do luto. Ela está morta
e podes ter isso, diz ele. Se conseguires
amar sem cortesia ou delicadeza,
diz a raposa, ama-a com o teu coração de lobo.
Porque os mortos devem ser desejados.
Não como nos longos casamentos,
em que nunca acontece nada.
Não nos bosques nem nos campos.
Não nas cidades. O doloroso amor de estar
permanentemente sem abrigo. Não a cor, mas a mancha.
Jack Gilbert
in Piolho n.º12, trad. de Inês Dias,
Edições Mortas / Black Sun, Dezembro 2013