[ID, Londres, 11/015]
quinta-feira, 19 de novembro de 2015
terça-feira, 17 de novembro de 2015
H de Heathrow Express
ACROBACIAS
sentados em Trafalgar Square
no intervalo de amigos
com o tempo entre as mãos
treinávamos o inglês
num inquérito de revista
com Francis Bacon na capa
que perguntava:
qual dos membros
- superiores ou inferiores -
preferias perder
(esta ablação em língua estrangeira
torna-se indolor, quase anestesiada)
respondeste: os braços
as pernas conservá-las-ia
como a liberdade de poder andar
respondi: as pernas
não queria ver-me
impedida de abraçar.
Assim juntando as nossas
perdas
eu abraço-me a ti
e peço-te anda, mostra-me o mundo
e quando nos cansarmos
abraçar-me-ás, então, com as pernas
e eu
andarei com os braços.
Ana Paula Inácio, 2010-1011,
Lisboa, Averno, 2011
sexta-feira, 13 de novembro de 2015
F de "(Une) Famille d'Arbres" (VIII)
GREVE GERAL
Nesta sede de
poder sem medida
gostaria de ter
um banco
e a fronde
de uma árvore.
Uma me bastaria:
raiz, e ramagem
puxada para os céus.
Banco com a dureza
mineral do carbono:
caroço universal -
um punho cerrado.
E depois quebrar
as regras, capaz de
fechar os olhos
sob o interdito
dessa frescura
sã crepuscular.
Inclinar aí a cabeça
sobre o peito,
sem alerta, e sentir,
invasivo, o spread
das sementes.
Paulo da Costa Domingos, «Voici la poésie ce matin
et pour la prose il y a les journaux»,
Lisboa, Averno, 2014
[ID, 'Longe da aldeia', 02/013]
Libellés :
"I'm building a still to slow down the time",
AVERNO
quarta-feira, 11 de novembro de 2015
H de "Hay que beber para recordar y comer para olvidar" (II)
Três livros preferidos de cozinha:
Inês de Ornellas e Castro (int., trad. e comentários), O Livro de Cozinha de Apício - Um Breviário do Gosto Imperial, Lisboa, Relógio D'Água, 2015
Eihei Dogen, Tenzo Kiôkun - Instruções para o Cozinheiro Zen, Lisboa, Assírio & Alvim, 2010
Manuel Vázquez Montalbán*, Las Recetas de Carvalho, 2.ª ed., Barcelona, Planeta, 2005
* A quem pertence a frase que serve de título ao post.
terça-feira, 10 de novembro de 2015
a de "aparece de vez em quando uma inês que gostaria de fotografar coincidências" (II)
Reconheces a força animal
da folha descendo, ave, em redor
do seu eixo. Em cada noite
os gestos de ver trazem-te
inquietude, contas as telhas que faltam
e a lanterna aponta ruídos.
Morreram dois peixes
nessa luz e outra moléstia
abre o outono, lançasses
o ácido às camélias e logo
havias de ver a falsa cor do céu.
A folha que desce é uma asa
no caminho da seda interior
da terra. Ou os teus dedos compondo
a feroz razão de uns enxertos.
Helder Moura Pereira
in AAVV, Dep. Leg. n.º 23571/88,
Lisboa, Frenesi, 1988
[ID, Jardim Constantino, 06/04/2011]
segunda-feira, 9 de novembro de 2015
A de Aniversário (XIV)
Sob a água
vê-se: Inês
posta em sossego,
pedacinhos de ossos.
Olha, aquele rapaz...
o seu corpo é apenas o estojo
duma jóia: ele tem os olhos de Inês.
José António Almeida, António Nogueira,
Lisboa, Edição do Autor, 1984
[ID, 'God is in the details', Madrid 015]
Libellés :
"Nous deux encore",
AVERNO,
God is in the details
sábado, 7 de novembro de 2015
T de Tempo Sem Tempo (XVI)
A torrente da multidão queria arrastar-me. As luzes verdes à esquina das ruas ordenavam-me que atravessasse. O polícia sorria a convidar-me para que caminhasse por entre os pregos de cabeça prateada. Até mesmo as folhas de Outono obedeciam à enxurrada. Eu, porém, apartei-me dela, como um objecto extraviado. Desviei-me e parei ao cimo das escadas que descem para os Cais. Lá em baixo deslizava o rio. Um rio diferente da torrente de que eu me separara formada por peças dissonantes que se chocavam com aspereza, movidas pela avidez e pelo desejo.
Corri pelas escadas abaixo em direcção ao molhe - os ruídos da cidade recuavam à medida que eu descia, as folhas murchas refugiavam-se aos cantos dos degraus sob o vento das minhas saias. Ao fundo das escadas deitavam-se os marinheiros naufragados da torrente das ruas, os vagabundos que se tinham afastado da multidão, que se haviam recusado a obedecer. Tal como eu, a uma dada altura do trajecto, separaram-se, e ei-los ali estendidos, náufragos, no sopé das árvores, a dormirem ou a beberem. Tinham abandonado o tempo, as riquezas, o trabalho, a escravidão. Caminhavam e dormiam contra o ritmo do mundo. [...]
Anaïs Nin, "A Casa Fluvial"
in Debaixo de uma redoma, trad. de Maria Ondina Braga,
Libellés :
"I'm building a still to slow down the time"
Subscrever:
Mensagens (Atom)