NO FUNDO DO SONHO
Às vezes tenho sonhos como mares:
as suas ondas batem-me, magoam-me,
deixam-me um gosto a sal sob a língua,
emaranham os meus cabelos e afogam-me.
E, quando chego ao fundo, repugnam-me
os seres que o habitam e o sujam,
seres escorregadios e viscosos,
sem pálpebras e sem extremidades,
sem linguagem, lágrimas ou ruído.
Às vezes tenho sonhos como mares
e, quando desperto enfim de um deles,
sei que me salvei de mais um naufrágio.
Amalia Bautista, Conta-mo outra vez,
trad. de Inês Dias, Lisboa, Averno, 2020
1 comentário:
o que haverá em nó que modifica a matéria dos sonhos. Éramos inventivos, as noites desfilavam em histórias sonhadas, sem medos, terrores ou cansaços.
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