sexta-feira, 11 de julho de 2014

N de "Na casa de Julho e Agosto" (IV)


NESTE SILÊNCIO

         
Neste silêncio oculto onde as tuas mãos se deslumbram a cada movimento, subsistimos com o peso do crepúsculo e a miséria da guerra.

Inútil a nossa vida, inútil a vida dos outros, quando o amor é um pássaro dentro duma gaiola no deserto. Inútil toda a simbologia funcional das imagens, porque ao homem é dado o sonho com o sentido das coisas.

De bruços sobre a areia, descanso as pálpebras no mar. A minha ociosidade é um peixe de prata adormecido nas ondas, um barco sem dono ancorado na doca. E hei-de morrer assim contigo, companheira ou ilusão do meu cansaço, porque a verdade que trouxemos é um trapézio vasio num circo em ruínas, uma flor no trapézio e muitos gatos a assistir até ao dia nunca mais do horizonte livre.
 
       
António Barahona da Fonseca, Poemas e Pedras,
Lisboa: edição do autor, 1962






[ID, Nazaré / Agosto 013]

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