Agora anoto cada vez mais a fadiga,
E dela falo cada vez menos.
Oh! tímidas capturas da minha alma,
Alegre e cálido tropel.
Que géneros de pássaros inventas para ti?
A quem os ofereces, ou será que os vendes?
Acaso habitas ninhos do presente
E do presente é a voz do teu cantar?
Regressa, alma minha, e extrai-me a pena;
Que cante velhas glórias o transístor.
Diz-me, alma, como é que via
A vida o voo do falcão?
Enquanto a neve, vinda do nada,
Revoluteia num qualquer confim,
Pinta sobre a morte, rua minha,
E no teu grito, ave, fala de viver.
Já vês, enquanto eu caminho, tu voas,
Alheia ao nosso mal-estar.
Já vês, eu sigo a minha vida, enquanto tu bates as asas
Gritando, alarmada, num qualquer lugar.
Joseph Brodsky
in Um Ateu no Campo, versões de João Rodrigues,
Lisboa, Edições Pirata, 2000